Em junho de 2019, realizamos uma aula com os alunos da Escola Municipal Básica Almirante Carvalhal, em Florianópolis, acerca das migrações, a fim de entender este processo histórico de natureza humana. O tema, de início, foi proposto pela professora Bárbara Giese, em uma de nossas reuniões do Programa de Iniciação à Docência (Pibid), e a ideia central que nos veio foi: trabalhar com o quesito da migração a partir da própria história e de seus vestígios na vida dos alunos. De imediato, pensamos em trabalhar com o 9º ano, uma vez que estavam se envolvendo melhor em todas as atividades propostas. Foi uma aula dada pelos bolsistas Lucas Eduardo Amaral, Leticia Machado Sthiler e Philipe Rocha.
A aula se iniciou com um tema que os alunos já estavam abordando em sala de aula, uma vez que teríamos que encaixar o assunto no decorrer dos conteúdos de história que estavam aprendendo: o entreguerras. Buscamos enfatizar que, devido às grandes guerras europeias, muitas pessoas se espalharam por diversos lugares do mundo, procurando refúgio, inclusive no Brasil (muitos deles em Santa Catarina). Mais ainda, comentamos não ter sido exclusividade desse período os europeus terem vindo ao Brasil em busca de uma nova vida, uma vez que isto já tinha ocorrido em outras épocas, como no período colonial, nas das grandes navegações, nas da modernização do país, etc.
Aproveitamos para lembrar que também somos imigrantes em Florianópolis (mesmo sendo migrantes internos no Brasil) e contamos os motivos de estar morando nesta cidade. Foi interessante ver o quanto os alunos pareceram interessados em saber mais sobre as nossas histórias, com poucas distrações. Logo após, fizemos uma reflexão correlacionando com nossos sobrenomes, sobre suas origens (europeias), assim como sobre a origem de alguns dos sobrenomes (de onde vieram, o que significam e como vieram parar no Brasil). Este foi o momento que aproveitamos para introduzir alguns mapas para eles: Um com os sobrenomes mais comuns por país ( disponível em https://bit.ly/2WXnozx) e o outro com os países invadidos pela Grã-Bretanha em algum momento na história (disponível em https://bit.ly/2wzkypR)
Ao usar o primeiro mapa, fizemos uma relação de como os sobrenomes mais populares em alguns países, como Portugal, Espanha, Itália, Alemanha e Japão, são também frequentes no Brasil. Além disso, estabelecemos, em conjunto com os alunos, correlações entre os sobrenomes aqui populares e sobrenomes idênticos em diversos países, como EUA, Reino Unido e Austrália. No segundo mapa, mostramos uma lista de todos os países que a Inglaterra colonizou no passado, para, assim, demonstrar que em diferentes épocas existiu o anseio de se deslocar e explorar novas terras, e que nós, pessoas do presente, somos o resultado desses inúmeros processos.
Logo após, com uma proposta mais intimista, fizemos uma roda de conversa com os alunos, perguntando quais deles tinham vindo de outra cidade para morar em Florianópolis. Em torno de dez alunos levantaram a mão e pedimos para que cada um deles nos contasse o motivo do deslocamento, que, resumido, em sua maioria foi em busca de melhores condições e qualidade de vida. Este foi um bom argumento para refletirem sobre a situação dos migrantes atuais, sobre os motivos de seus deslocamentos (que são os mesmos dos alunos). Desta forma, relacionamos o tema com o próximo tópico, que foram as notícias atuais sobre migrantes ao redor do mundo, como a notícia que ilustra este post. Trata-se de notícia de 2015, que relata que haitianos no Brasil eram contratados de acordo com o tamanho de suas canelas, fato curioso, mas, como explicado, dando a entender que “canelas finas significa que trabalham”, ao contrário dos possuidores de “canelas grossas’’.[1]
A notícia nos ajudou a refletir sobre como os migrantes se deslocam de seus locais por motivos comuns a todos, e sobre como são recebidos em países estrangeiros. Isso nos deu abertura para pensar juntos sobre questões como: limite de fronteiras, noções imaginadas de propriedades de espaços geográficos, que, como nações, são identidades imaginadas e criadas no decorrer da história (e não algo natural). Também aproveitamos para desmitificar a noção de povo puro, uma vez que a história é feita de deslocamentos humanos pelo globo terrestre desde o princípio, e também sobre como os seres humanos se apropriam de locais, lugares e culturas.
Na penúltima etapa, mostramos a fonte histórica do alemão Thomas Davatz, em seu livro Memórias de um Colono no Brasil, de 1850, em que relata sua recepção no estado de São Paulo, denunciando explorações e abusos das forças de poder e fabris:
DAVATZ, Thomas. Memórias de um colono no Brasil. 1855. p. 72.
Salientamos, mais uma vez, através desta fonte histórica, que a migração é algo que ocorre em distintas épocas e que, embora seja um direito, em toda a história da era moderna enfrenta problemas por conta de determinados grupos humanos que dominam os espaços e dele se apropriam, contrariando o direito de todos de se locomover por necessidade, em busca de melhores espaços para seu bem-estar, o que não foi diferente com Thomas Davatz, aliás, por ele comprovado.
Consideramos que a aula foi bem aproveitada por todos, pois sentimos um envolvimento legal dos alunos, com perguntas, opiniões e bastante troca de ideias. Não tivemos muitas decepções, mas notamos que as meninas participaram mais que os meninos, assim como houve poucas dispersões. Gostamos muito dessa experiência em sala de aula, pois pudemos relacionar um tema tão corriqueiro nos noticiários jornalísticos com a realidade dos alunos, para que eles pudessem se enxergar como também frutos e, possivelmente, no futuro, migrantes.
[1] Disponível em: http://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2015/05/largura-de-canela-e-requisito-para-haitiano-conseguir-emprego-no-brasil.html. Acessado em: 23 jun. 2019.
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